Você sabe o que é sobrepreço em obras públicas e serviços de engenharia? Sobrepreço ocorre quando o valor cobrado em contratos públicos está acima do preço de mercado, contrariando normas e referências oficiais como Sinapi e Sicro. Esse erro pode gerar graves consequências para empresas do setor de construção civil e serviços.
“Os valores pagos pelas compras e contratações da Administração não podem exceder os preços de mercado, cujos valores máximos, no caso da contratação de obras e serviços de engenharia, estão indicados nos sistemas referenciais oficiais, no caso, em especial, o Sinapi. A cobrança de valores excedentes é ilegal não podendo ser aceita por esta Corte de Contas…” (Acórdão 440/2025 – Plenário do TCU)
TCU e Sobrepreço: Tolerância Zero em Licitações
O Tribunal de Contas da União (TCU) é rigoroso: não existe margem de tolerância para sobrepreço em contratos públicos. Mesmo pequenas diferenças, como 1% ou 3% acima do valor de referência, podem ser consideradas irregulares. O TCU exige que os preços estejam sempre alinhados ao mercado e às tabelas oficiais.
“Não existe margem tolerável de sobrepreço global. […] A Administração Pública deve sempre buscar contratações por valores inferiores àqueles [dos sistemas referenciais], os quais jamais devem se distanciar da realidade do mercado.” (Acórdão 440/2025 – Plenário do TCU)
Exemplos Reais de Sobrepreço em Obras e Serviços
Case 1: Construção Civil
Uma construtora venceu licitação para construir uma escola pública. O orçamento foi apresentado acima do valor do Sinapi, alegando custos extras. O TCU exigiu a devolução do valor excedente e aplicou multa à empresa.
Case 2: Serviços de Manutenção
Uma empresa de manutenção apresentou planilhas baseadas em estudos próprios, sem seguir os sistemas oficiais. O TCU desconsiderou os argumentos e aplicou sanções.
Principais Riscos do Sobrepreço para Empresas
Multas e devolução de valores: O TCU pode exigir ressarcimento e aplicar multas pesadas.
Perda de contratos e credibilidade: Empresas envolvidas em sobrepreço podem ser proibidas de contratar com o governo.
Processos judiciais e custos elevados: Divergências sobre preços podem gerar litígios longos e caros.
5 Dicas de Ouro para Evitar Sobrepreço em Obras e Serviços
Use sempre os sistemas oficiais de referência (Sinapi, Sicro) para calcular preços.
Documente todo o processo de formação de preços com planilhas detalhadas e justificativas claras.
Atualize os valores conforme a data-base do contrato e o mercado.
Não dependa apenas de consultorias privadas; utilize estudos externos apenas como apoio.
Implemente controles internos rigorosos e revise planilhas periodicamente.
Prevenção é o Melhor Negócio: Invista em Compliance
O Acórdão 440/2025 do TCU mostra que a fiscalização está cada vez mais rigorosa. Empresas que investem em compliance, transparência e atualização constante têm mais chances de crescer de forma sustentável e segura no setor de obras públicas e serviços de engenharia.
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A interpretação restritiva de cláusulas nos editais de licitação é um ponto crucial para empresas de construção civil que desejam atuar em contratos públicos. Frequentemente, as exigências detalhadas em editais são aplicadas de forma rígida, o que pode limitar a competitividade e dificultar o ingresso de empresas qualificadas que não atendem a alguns requisitos específicos.
O Que é a Interpretação Restritiva nas Licitações para a Construção Civil?
A interpretação restritiva ocorre quando os critérios de um edital são aplicados de maneira literal e excludente. Nos processos de licitações para a construção civil, isso pode impactar diretamente empresas de médio porte, que muitas vezes possuem capacidade técnica para executar a obra, mas são excluídas devido a exigências detalhistas e às vezes desnecessárias. Esse tipo de interpretação visa a garantir o cumprimento rigoroso das disposições do edital, mas pode resultar em processos licitatórios menos competitivos, restringindo o número de participantes.
Importância e Impacto para as Empresas de Construção Civil
Para empresas que participam de licitações na construção civil, a interpretação restritiva pode representar um grande obstáculo. Por exemplo, em editais que exigem comprovação de experiência em obras de valor exato ou métodos construtivos específicos, a interpretação literal pode excluir empresas qualificadas que não atendem perfeitamente a essas exigências. Essa restrição afeta a concorrência, o que pode prejudicar a administração pública ao limitar a escolha para contratação.
Decisões dos Tribunais de Contas sobre Cláusulas Restritivas
A jurisprudência dos Tribunais de Contas tem importante papel na análise de cláusulas restritivas. Em diversas decisões, como nos Acórdãos nº 950/2007 e nº 1985/2017 do Tribunal de Contas da União (TCU), ficou claro que a administração pública deve evitar exigências excessivas sem fundamentação, garantindo que as cláusulas do edital estejam alinhadas com o objeto licitado e que respeitem o princípio da competitividade. Quando há um exagero nas exigências, a empresa interessada pode apresentar uma impugnação ao edital, solicitando a revisão de requisitos que limitem sua participação sem justificativa técnica.
Estratégias para Empresas da Construção Civil em Licitações Públicas
Leitura Atenta do Edital: Analise as cláusulas cuidadosamente para identificar exigências potencialmente restritivas.
Impugnação ao Edital: Empresas que identificarem exigências sem embasamento técnico podem impugnar o edital, questionando as cláusulas restritivas e solicitando sua alteração.
Parcerias Estratégicas: Quando possível, unir-se a empresas que atendem a requisitos específicos pode facilitar a participação em licitações.
Acompanhamento da Jurisprudência: Atualizar-se com as decisões dos Tribunais de Contas sobre restrições nos editais é fundamental para fundamentar as impugnações e guiar a estratégia de participação.
A interpretação restritiva de cláusulas em licitações para a construção civil é um aspecto técnico, mas com impacto direto sobre a competitividade e viabilidade de participação para empresas de médio porte. Estar atento a essas questões e recorrer a impugnações quando necessário é uma forma de garantir que as licitações se mantenham justas e acessíveis. Seguir a jurisprudência dos Tribunais de Contas ajuda as empresas a defender seu direito de participar das licitações de forma competitiva e justa.
Flávio Lavareda
Dúvidas em suas licitações e contratos ? Fale conosco
Os órgãos públicos interessados em contratar o fornecimento de bens ou a prestação de serviços junto ao setor privado estão obrigados a promover uma prévia e detalhada pesquisa de preços a fim de que a contratação seja alinhada com os valores praticados no mercado.
OK, MAS QUAL MERCADO ?
Inicialmente o entendimento geral era de que por mercado entenderia-se o ambiente onde aquele produto ou serviço era normalmente comercializado; ou seja, mercado o preço de mercado seria aquele comumente adotado no âmbito de atuação e comércio das empresas a serem contratadas.
A abordagem do que pode ser considerado mercado passou por incrementos ao longo do tempo. Atualmente, ao analisar o comportamento dos preços praticados no mercado, a Administração Pública deve classificá-lo de acordo com os contratantes, sejam públicos ou privados.
Assim, com o objetivo de ampliar a pesquisa obrigatória a que estão submetidos, os órgãos públicos foram, aos poucos, ampliando o escopo dessa investigação e evoluíram para o conceito de cesta de preços.
A “cesta de preços” é um conceito utilizado em contratações públicas e licitações para se referir a uma lista de valores de referência para diferentes produtos, serviços ou itens que podem ser adquiridos pelo órgão público em um determinado período.
A “cesta” é formada através de uma pesquisa que, atualmente, concentra-se muito mais nos valores pagos pela própria Administração Pública em contratações similares. É o caso, por exemplo, da aquisição de uniformes. O órgão licitante, além da verificação dos preços praticados no no setor privado, está obrigado a identificar os valores que outros entes públicos adquiriram o mesmo bem. Esta última informação será a mais importante dentro da pesquisa de preços.
Portanto, o mercado que mais interessa ao ente público contratante é o mercado formado por empresas privadas de um lado e, de outro, a Administração Pública, seja Federal, Estadual ou Municipal.
É interessante trazer recente decisão do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCEMG), através do Tribunal Pleno, que fixou, por unanimidade, o prejulgamento de tese com caráter normativo:
1. A tabela de preço emitida por entidade privada pode ser utilizada somente para fins comparativos, no âmbito da denominada “cesta de preços aceitáveis”, mas não como referencial exclusivo, uma vez que não reflete os preços praticados na esfera pública.
2. A tabela de preços da Revista Simpro não pode ser utilizada como parâmetro para incidir o critério do maior desconto na fase de julgamento da licitação, tendo em vista que os valores dela constantes não refletem efetivamente os preços de mercado e, notadamente, aqueles praticados na esfera pública.
Além disso, quanto à pesquisa de mercado em si, o Tribunal narrou a necessidade de que os preços fossem comparados a partir dos registros feitos no Banco de Preços de Saúde – BPS, sistema desenvolvido pelo Ministério de Saúde, para registrar informações relativas a compras de medicamentos e produtos por instituições públicas e privadas.
Dessa forma, o relator concluiu que não há óbice na cotação de preços junto a fornecedores privados para obtenção da referência de preço, desde que essa pesquisa utilize outras fontes para fins comparativos, preferencialmente, os registrados no Banco de Preços de Saúde pelos órgãos administrativos.
Fica claro que existe mais de um mercado, portanto. Um é o mercado geral que define seus preços através de estratégias próprias e varia de acordo com a demanda pelo produto ou serviço. O outro, e mais importante no caso, é o mercado de preços praticados exclusivamente para os setores públicos.
Sim. Existe um mercado paralelo formado entre fornecedores privados e órgãos públicos onde preço e condições de fornecimento são diferentes daqueles normalmente observados no campo privado.
Basta ver que uma prefeitura normalmente não compra canetas pelo mesmo preço que uma escola particular adquire. Esta tampouco possui as condições de pagamento que a prefeitura comumente obtém em seu favor.
Então, é em cima dessa realidade que as pesquisas de mercado devem ser realizadas: a realidade do mercado de compras e fornecimento públicos.
COMO ATUAR ESTRATEGICAMENTE DIANTE DESSA REALIDADE ?
Pense em impugnações de valores estimados e recursos contra vencedores que apresentaram valores muito distantes daqueles praticados no mercado de aquisições/contratações públicas.
Na realidade, ao analisar um edital de licitação, o pretenso fornecedor de produtos ou serviços precisa obrigatoriamente (se você ainda não faz isso você está perdendo) verificar a competitividade de seu preço final.
Essa análise leva em conta a realidade do mercado privado, as eventuais tabelas de preço oficiais ou particulares e, o mais importante, os valores pagos pelos órgãos públicos pelo mesmo produto ou serviço; preferentemente se situados próximos (na mesma região) do ente que promove a licitação.
Sabendo qual é o preço médio praticado no mercado especial das compras públicas, o licitante se fortalece, pois, como dizem, a informação ganha a guerra. Bem, pode ser até que não ganhe, mas, sem dúvida, é um conhecimento pra lá de valioso numa competição acirrada.
Então, com a informação em mente, verifique o valor estimado colocado no edital. Se o valor estiver muito acima da média do mercado de aquisições públicas, você já pode esperar por uma queda drástica dos preços durante a fase de lances. Se estiver abaixo daquela média, já se pode começar a pensar em impugnar o edital a fim de demonstrar para a Comissão de Licitação que o preço cotado não reflete a realidade do mercado.
Ao final da fase disputa, um valor acima da média de aquisições públicas pode ser alvo de recurso que demonstre não haver vantagem na contratação para o órgão público licitante. Por outro lado, um valor inferior, pode suscitar a ocorrência de inexequibilidade da proposta vencedora.
O importante é que a empresa licitante não se atenha às concorrentes para formação do preço. É fundamental o acompanhamento dos valores praticados no mercado específico de aquisições e contratações públicas para que se tenha um desempenho mais competitivo nas licitações de seu interesse.
Flávio Lavareda
CEO da Bravo Consultoria em Licitações e Contratos
O reajuste de preços em contratos administrativos pode gerar algum debate, principalmente quando não suficiente e claramente definido no edital de licitação e no corpo do instrumento contratual.
A questão interessa, sobretudo, a obras públicas e serviços de engenharia, mas já vi complicações em praticamente todos os tipos de vendas/serviços ao governo, seja municipal estadual ou federal.
O problema mais agudo está em saber qual é o marco inicial do reajuste.
A velha fórmula de que os contratos são reajustados a cada 12 meses não é o bastante e, no mais das vezes, não representa uma recomposição efetivas dos preços contratados.
Vamos ver o que diz a Lei 8.666/93:
Art. 40. O edital conterá no preâmbulo o número de ordem em série anual, o nome da repartição interessada e de seu setor, a modalidade, o regime de execução e o tipo da licitação, a menção de que será regida por esta Lei, o local, dia e hora para recebimento da documentação e proposta, bem como para início da abertura dos envelopes, e indicará, obrigatoriamente, o seguinte:
XI – critério de reajuste, que deverá retratar a variação efetiva do custo de produção, admitida a adoção de índices específicos ou setoriais, desde a data prevista para apresentação da proposta, ou do orçamento a que essa proposta se referir, até a data do adimplemento de cada parcela;
Parece simples: o marco inicial de cálculo pode se assentar sobre o momento em que o orçamento foi elaborado pela Administração Pública ou a ocasião da apresentação da proposta pelo licitante.
Mas existe outra lei que trata do assunto. E essa lei atrapalha bastante a vida da empresas contratadas. A lei 10.192/2001 determina:
Art. 2o É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano.
§ 1o É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.
A partir daí, a maioria dos órgãos públicos tomam como data base para reajuste a assinatura do contrato. Daí, após o transcurso de um ano de execução, implementam o reajuste segundo o índice contratado.
Essa atitude tão comum aos gestores públicos ignora o art. 40 da Lei Geral de Licitações. Acontece que essa lei é notávelmente clara sobre como proceder o reajuste e, por se tratar especificamente de contratos administrativos, deve obrigatoriamente se sobrepor a qualquer outra lei geral, como a 10.192/2001.
O Tribunal de Contas da União decidiu recentemente:
Acórdão 1587/2023 Plenário (Auditoria, Relator Ministro Antonio Anastasia)
É irregular reajuste contratual com prazo contado da assinatura do contrato, pois o marco a partir do qual se computa período de tempo para aplicação de índices de reajustamento é: i) a data da apresentação da proposta ou a do orçamento a que a proposta se referir, de acordo com o previsto no edital (art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993); ou então ii) a data do orçamento estimado (art. 25, § 7º, da Lei 14.133/2021 – nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos).
É preciso chamar atenção para o seguinte trecho da decisão:
“A interpretação sistemática do inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal, do art. 3º, § 1º, da Lei 10.192/2001 e do art. 40, inciso XI, da Lei 8.666/1993 indica que o marco inicial, a partir do qual se computa o período de um ano para a aplicação de índices de reajustamento previstos em edital, é a data da apresentação da proposta ou a do orçamento a que a proposta se referir, de acordo com o previsto no edital”. “
Portanto, o marco inicial é a, preferencialmente, a data do orçamento estimativo da licitação. É isso: claro e simples.
Vale a pena destacar que a decisão acima foi tirada de uma impugnação onde a empresa questionava o edital ainda antes da participação no processo licitatório. Um ótimo exemplo do manejo de instrumentos legais com objetivos estratégicos, coisa que sempre recomendo por aqui.
A Lei das Estatais desenha uma metodologia própria de licitações um pouco diferente daquela que vemos na Lei 8.666/93.
Na verdade, a Lei 13.303/2023 é, em muitos aspectos, mais moderna em seus procedimentos que a Lei Geral. Isso não somente por que é mais nova, mas sobretudo em razão da opção por metodologias mais modernas de aquisição e contratação por entes públicos. Tanto é assim que a Nova Lei de Licitações que entrará em vigor em Dezembro/2023 sorveu muitos de seus dispositivos, e quase a totalidade de sua lógica.
Uma particularidade importante da lei das estatais está na qualificação técnica dos licitantes. Vejamos:
Art. 58. A habilitação será apreciada exclusivamente a partir dos seguintes parâmetros:
I – exigência da apresentação de documentos aptos a comprovar a possibilidade da aquisição de direitos e da contração de obrigações por parte do licitante;
II – qualificação técnica, restrita a parcelas do objeto técnica ou economicamente relevantes, de acordo com parâmetros estabelecidos de forma expressa no instrumento convocatório;
III – capacidade econômica e financeira;
IV – recolhimento de quantia a título de adiantamento, tratando-se de licitações em que se utilize como critério de julgamento a maior oferta de preço.
O inciso II é o que tratamos brevemente aqui.
Veja que o inciso II ultrapassa em muito seu correspondente na lei 8.666/93 na medida em que tem conteúdo mais elástico, deixando que a estatal praticamente desenhe um critério próprio de avaliar a qualificação técnica de acordo com cada objeto licitado particularmente.
Bom para áreas altamente tecnológicas, mas um tormento para licitantes de setores, digamos, “comuns”.
O TCU decidiu:
Licitação. Empresa estatal. Qualificação técnica. Avaliação de desempenho. Licitante.
É possível, para fins de qualificação técnica em licitações realizadas por empresas públicas e sociedades de economia mista, a utilização de indicadores de avaliação de desempenho de licitantes na execução de contratos anteriores com a entidade promotora do certame, desde que prevista no instrumento convocatório e restrita às parcelas do objeto técnica ou economicamente relevantes (art. 58 da Lei 13.303/2016 – Lei das Estatais).
Acórdão 1312/2023 Plenário (Representação, Relator Ministro Jorge Oliveira)
A aplicação do inciso II do art. 58 da Lei 1303/2016, nesse ponto, foi muito bem-vinda. Afinal, numa disputa onde o fator determinante é o menor preço, muitas vezes um prestador de serviços ou fornecedor mal avaliado pelo órgão licitante a partir de contratações anteriores junto ao mesmo órgão, pode se sagrar vencedor, não atendendo aos fins desejados pela estatal que, dado se tratar de empresa cujos serviços estão reconhecidamente aquém da qualidade desejada, através de constatação empírica.
Contudo, é importante destacar que, a meu ver, isso somente pode ocorrer se, na vigência do contrato anterior, foi instaurado um processo administrativo com aplicação de penalidade. Caso contrário, a sujeição à subjetividade dos agentes públicos pode apontar a escolha para a ilegalidade.
A lei 8.666/93 define o preço inexequível a partir de uma fórmula pouco amigável de verificação:
Art. 48. Serão desclassificadas:
II – propostas com valor global superior ao limite estabelecido ou com preços manifestamente inexeqüiveis, assim considerados aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentescom os de mercado e que os coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especificadas no ato convocatório da licitação.
§ 1º Para os efeitos do disposto no inciso II deste artigo consideram-se manifestamente inexeqüíveis, no caso de licitações de menor preço para obras e serviços de engenharia, as propostas cujos valores sejam inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores:
a) média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinqüenta por cento) do valor orçado pela administração, ou
b) valor orçado pela administração.
É preciso decupar o artigo 48 caso desejemos entendê-lo minimamente. Então vamos começar.
“MANIFESTAMENTE INEXEQUÍVEIS….”
As coisas já se complicam logo no início. A lei define duas vezes o que seriam considerados preços manifestamente inexequíveis. E o pior, as duas definições são diferentes!,
Em um primeiro momento, o texto da lei diz que manifestamente inexequíveis são aqueles preços que “não venham a ter demonstrada sua viabilidade através de documentação que comprove que os custos dos insumos são coerentescom os de mercado e que os coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução do objeto do contrato, condições estas necessariamente especificadas no ato convocatório da licitação.”
A questão dos custos dos insumos serem coerentes com os praticados no mercado não deve gerar dúvidas: se questionado, o licitante deve apresentar sua planilha e evidenciar que seus preços partiram de uma estratégia empresarial, pois os custos dos insumos são os de uso comum no mercado, levando-se em conta a região, o tamanho da empresa, contratos especiais com fornecedores, etc.
Já os coeficientes de produtividade podem gerar confusão – e geram, muita! É que tais coeficientes envolvem justamente a parte estratégica da pessoa jurídica, seu diferencial de mercado, visão de longo prazo e vantagens competitivas que nem sempre o gestor deseja expor publicamente.
Um coeficiente de produtividade é um valor numérico que expressa a relação entre a quantidade de produção obtida e os recursos utilizados para obtê-la. Ele é frequentemente utilizado para medir a eficiência e a eficácia de um processo produtivo ou de uma atividade econômica. Em geral, quanto maior o coeficiente de produtividade, mais eficiente é considerada a utilização dos recursos para alcançar um determinado nível de produção.
Os coeficientes de produtividade podem ser calculados de diferentes maneiras, dependendo do contexto. Por exemplo, na agricultura, o coeficiente de produtividade pode ser calculado como a relação entre a quantidade de colheita obtida e a quantidade de terra cultivada ou os insumos agrícolas utilizados, como sementes, fertilizantes e água.
Em ambientes industriais, o coeficiente de produtividade pode ser calculado como a relação entre a quantidade de produtos fabricados e os recursos empregados, como mão-de-obra, matéria-prima e tempo. Nas atividades de prestação de serviços, o coeficiente de produtividade pode ser medido pela relação entre a quantidade de serviços realizados e os recursos envolvidos, como horas de trabalho e equipamentos.
O cálculo do coeficiente de produtividade na construção civil pode variar dependendo do tipo de atividade ou processo que você está avaliando. No entanto, uma abordagem geral envolve a comparação entre a quantidade de trabalho realizado (geralmente medida em unidades físicas, como metros quadrados de construção, metros cúbicos de concreto, etc.) e os recursos empregados para realizar esse trabalho (mão-de-obra, equipamentos, materiais, etc.).
Aqui está uma fórmula geral que pode ser usada para calcular o coeficiente de produtividade na construção civil:
Coeficiente de Produtividade = Quantidade de Trabalho Realizado / Quantidade de Recursos Utilizados
Vamos considerar um exemplo específico para tornar isso mais claro. Suponha que você deseja calcular o coeficiente de produtividade para a instalação de um revestimento cerâmico em um determinado local de construção. Você precisa levar em conta a área total do revestimento cerâmico colocado (em metros quadrados) e os recursos utilizados, como a quantidade de argamassa, o número de trabalhadores envolvidos e o tempo necessário para completar o trabalho.
Use as teclas de seta esquerda ou direita ou arraste com o mouse para alterar a posição do gradiente. Pressione o botão para alterar a cor ou remover o ponto de controle.
A fórmula específica pode ser algo como:
Coeficiente de Produtividade = Área de Revestimento Cerâmico Instalado / (Quantidade de Argamassa + Número de Trabalhadores + Tempo)
Nesse exemplo, quanto maior o valor do coeficiente de produtividade, mais eficiente foi a instalação do revestimento cerâmico em relação aos recursos utilizados. Se o coeficiente de produtividade for baixo, pode ser um indicativo de que há oportunidades de melhoria nos processos, na alocação de recursos ou em outros aspectos da execução da tarefa.
Assim, de acordo com o que a lei diz em primeiro lugar, é manifestamente inexequível o preço formado com descolamento do valor dos custos, e também aquele construído com baixo coeficiente de produtividade. Ou seja, nesse último caso, o preço mal planejado.
OBRAS E SERVIÇOS DE ENGENHARIA
Posteriormente, o mesmo art. 48 volta a dizer o que são preços manifestamente inexequíveis, só que agora dizendo serem aqueles que, ao se submeterem à fórmula oferecida pela lei, não alcançam a média ponderada formada pelos preços dos demais licitantes e o valor de referência da licitação.
§ 1º Para os efeitos do disposto no inciso II deste artigo consideram-se manifestamente inexeqüíveis, no caso de licitações de menor preço para obras e serviços de engenharia, as propostas cujos valores sejam inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores:
a) média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinqüenta por cento) do valor orçado pela administração, ou
b) valor orçado pela administração.
Assim, teremos como exemplo, considerando um serviço de engenharia cuja licitação recebeu as propostas de três empresas:
Tomando a alínea “a” do texto legal acima transcrito, temos que o único valor que se encontra 50% superior ao orçado foi aquele oferecido pela EMPRESA 1, ou seja, R$ 210 mil.
Sendo assim, serão desclassificadas por inexequibilidade as propostas inferiores a R$ 147 mil, exatamente 70% de R$ 210 mil, o único valor superior a 50% do orçado pelo órgão llicitante.
Na hipótese acima, o vencedor da licitação não será o que apresentou o menor preço. pelo contrário, vence a EMPRESA 1, com o valor de R$ 210.000,00.
EMPRESA 02 e EMPRESA 03 ofereceram preços inexequíveis.
MAS A SITUAÇÃO PODE FICAR MAIS DIFÍCIL….
O Tribunal de Contas da União já determinou inúmeras vezes que a inexequibilidade não pode ser declarada pela comissão de licitação sem que antes se dê oportunidade ao licitante de comprovar a exequibilidade de seu preço.
Entendemos que a Lei 8.666/93 indicou um caminho geral de investigação da inexequibilidade orientando onde devem ser encontrados elementos para verificação da viabilidade contratual: insumos e coeficiente de produtividade.
De acordo com esses casos, há que se orientar pelas fórmulas descritas no parágrafo primeiro do art. 48. Contudo, é preciso que um dos licitantes recorra da declaração do vencedor e indique na planilha dele onde está o descolamento que evidenciará a inexequibilidade dos preços. Demonstrar por que o contrato não será regularmente executado tendo por base a planilha de custos da empresa vencedora.
O Tribunal de Contas da União já determinou inúmeras vezes que a inexequibilidade não pode ser declarada pela comissão de licitação sem que antes se dê oportunidade ao licitante de comprovar a exequibilidade de seu preço.
Entendemos que a Lei 8.666/93 indicou um caminho geral de investigação da inexequibilidade orientando onde devem ser encontrados elementos para verificação da viabilidade contratual: insumos e coeficiente de produtividade.
De acordo com esses casos, há que se orientar pelas fórmulas descritas no parágrafo primeiro do art. 48. Contudo, é preciso que um dos licitantes recorra da declaração do vencedor e indique na planilha dele onde está o descolamento que evidenciará a inexequibilidade dos preços. Demonstrar por que o contrato não será regularmente executado tendo por base a planilha de custos da empresa vencedora.
Acórdão 3092/2014-Plenário
A proposta de licitante com margem de lucro mínima ou sem margem de lucro não conduz, necessariamente, à inexequibilidade, pois tal fato depende da estratégia comercial da empresa. A desclassificação por inexequibilidade deve ser objetivamente demonstrada, a partir de critérios previamente publicados, após dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade de sua proposta.
Foram tantas as ocasiões em que o TCU se manifestou no mesmo sentido que o assunto foi elevado a súmula de jurisprudência:
SÚMULA TCU 262: O critério definido no art. 48, inciso II, § 1º, alíneas “a” e “b”, da Lei 8.666/1993 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, devendo a Administração dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta.
Acórdão 1850/2020-Plenário
O juízo sobre a inexequibilidade, em regra, tem como parâmetro o valor global da proposta, no entanto, admite exceções quando os itens impugnados possuem custo total materialmente relevante e são essenciais para a boa execução do objeto licitado, devendo a Administração dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta (art. 48, inciso II e § 1º, alínea “b”, da Lei 8.666/1993) .
A NOVA LEI DE LICITAÇÕES E A INEXEQUIBILIDADE
A Nova Lei de Licitações 14.133/2021 trata a inexequibilidade da seguinte maneira:
Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:
III – apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;
IV – não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração;
§ 2º A Administração poderá realizar diligências para aferir a exequibilidade das propostas ou exigir dos licitantes que ela seja demonstrada, conforme disposto no inciso IV do caput deste artigo.
§ 3º No caso de obras e serviços de engenharia e arquitetura, para efeito de avaliação da exequibilidade e de sobrepreço, serão considerados o preço global, os quantitativos e os preços unitários tidos como relevantes, observado o critério de aceitabilidade de preços unitário e global a ser fixado no edital, conforme as especificidades do mercado correspondente.
§ 4º No caso de obras e serviços de engenharia, serão consideradas inexequíveis as propostas cujos valores forem inferiores a 75% (setenta e cinco por cento) do valor orçado pela Administração.
A nova lei entra em vigor em Dezembro de 2023 e modifica substancialmente o método de aferição das inexigibilidades. Começa por retirar do texto a “gordura” retórica do seu predecessor; saem a expressão “manifestamente inexequível” e as fórmulas de cálculo, bem como menções a custos de insumos e coeficientes de produtividade.
Isso já é ótimo, pois muita da confusão gerada no âmbito da Administração pública nascia no texto truncado da lei anterior.
Além disso, retirar avaliação de custos de insumos e coeficientes de produção contribui para preservar uma liberdade inerente à atividade privada de organizar autonomamente sua produção e estratégias comerciais.
Por fim, reduzir as fórmulas de investigação a uma metodologia de 75% do valor orçado, nos casos de obras, serviços de engenharia e arquitetura, facilita o cálculo e oferece um mecanismo simples de entender, quer para o agente público quer para a empresa licitante.
Porém, a obscuridade agora é outra. O texto da nova lei faz parecer que a oportunidade de demonstração da exequibilidade da proposta fica a depender de uma solicitação da comissão de licitação, não sendo mais um direito do licitante vencedor, como o TCU tratava na vigência da lei anterior. Ao mesmo tempo, faculta à Administração a realização de diligências, que nada mais são do que pesquisas acerca do preço apresentado, pesquisas essas realizadas como? Ora, não vejo outra saída que não seja solicitar o detalhamento dos custos do licitante vencedor.
OBRAS E SERVIÇOS DE ENGENHARIA NA NOVA LEI
Mais uma vez as obras e serviços de engenharia recebem tratamento especial na aferição da inexequibilidade. E é bom que assim seja, dado que a formação de preços nesses casos é muito mais complexa do que no simples fornecimento de materiais.
Obras e serviços de engenharia – e também arquitetura – quando da análise da viabilidade do contrato a partir do preço vencedor, terão investigadas o preço global, os quantitativos e os preços unitários tidos como relevantes.
Quais seriam os quantitativos e preços unitários relevantes para fins de aferição da inexequibilidade ?
Seriam, a meu ver, as partes da obra ou serviço com valor mais expressivo, e também – isso é muito importante – aqueles mais sujeitos a oscilação no mercado.
A nova lei acrescenta ainda o percentual sobre o valor orçado. Neste sentido, se a proposta ficar abaixo de 75% do valor orçado será considerada inexequível.
Outra dúvida surge: se a proposta apresentar um preço inferior a 75% do orçado a desclassificação por inexequibilidade será automática?
Entendo que não, embora ainda precisamos aguardar o que os tribunais de contas dirão a respeito. Mas o posicionamento do TCU à luz da antiga lei sempre foi o de conceder ao licitante a oportunidade de defender sua proposta e demonstrar a viabilidade financeira. No texto da antiga lei também dava-se a impressão de uma desclassificação imediata, exatamente como a nova lei faz, e isso não foi obstáculo para que os tribunais obrigassem a Administração a diligenciar no sentido de o licitante demonstrar a viabilidade.
Além disso, esse posicionamento do TCU é escorado no Direito de Petição e na busca da proposta mais vantajosa para a Administração, valores importantes também na nova lei.
E é isso! A coisa toda é mais complexa do que parece e é preciso atenção para lidar com situações concretas individualmente, pois, como vimos, a mera aplicação de fórmulas não é suficiente.
O seguro-garantia em licitações e contratos administrativos é um instrumento utilizado para assegurar o cumprimento das obrigações assumidas pelo licitante vencedor e pelo contratado perante a administração pública. Ele desempenha um papel importante na mitigação de riscos e na garantia da segurança das partes envolvidas.
É fundamental destacar as diferenças entre esse seguro e outras modalidades de garantia, como a caução em dinheiro e a fiança bancária. Enquanto a caução em dinheiro envolve o depósito de uma quantia em espécie como garantia, e a fiança bancária é uma garantia oferecida por uma instituição financeira, o seguro garantia é uma apólice contratada junto a uma seguradora. Nesse caso, a seguradora assume a responsabilidade de indenizar a administração pública caso o licitante ou contratado descumpra suas obrigações.
Segundo a Lei 8.666/93, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, – Seguro-Garantia é o seguro que garante o fiel cumprimento das obrigações assumidas por empresas em licitações e contratos.
Já a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei 14.133/2021), o seguro-garantia se refere exclusivamente ao cumprimento fiel dos contratos, excluindo-o da fase de licitação.
No entanto, as duas leis se referem à obrigação de previsão no edital de licitação e à necessidade de que suas cláusulas estejam bem definidas quanto a direitos, obrigações e, principalmente, hipóteses de cobertura, como deixa claro o Tribunal de Contas da União:
Tribunal de Contas da União (Acórdão nº 1.537/2018): “O seguro garantia pode ser utilizado como instrumento de garantia de contratos administrativos, desde que devidamente previsto no edital e com condições que atendam aos requisitos legais.É necessário, no entanto, que haja clareza quanto às obrigações cobertas pelo seguro e aos procedimentos para acionamento da garantia.”
É importante atentar para uma diferença importante entre esse tipo de garantia ligada ao contrato e aquela conhecida como “garantia da proposta” que diz respeito à fase licitatória.
Apenas para fins elucidativos, a mencionada garantia da proposta está prevista no artigo 31 da Lei 8.666/93:
Art. 31. A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:
III – garantia, nas mesmas modalidades e critérios previstos no “caput” e § 1o do art. 56 desta Lei, limitada a 1% (um por cento) do valor estimado do objeto da contratação.
O art. 56 acima transcrito enumera as modalidades de garantia como sendo a caução em dinheiro, o seguro-garantia e a fiança bancária.
Portanto, a garantia da proposta pode ser definida pela Administração Pública e precisa constar no edital de licitação, devendo ser escolhida entre as modalidades acima expostas.
O seguro garantia é diferente. É uma forma de garantia do contrato, ou melhor, da fiel cumprimento das obrigações contratuais, podendo ser a modalidade escolhida pelo contratado entre caução e fiança bancária.
SEGURO GARANTIA NA CONSTRUÇÃO CIVIL DE OBRAS PÚBLICAS
A Nova Lei de Licitações traz novas considerações sobre a figura do seguro-garantia especificamente direcionadas às contratações de obras públicas.
Na realidade, o que a nova legislação faz é adotar um entendimento já antigo no âmbito do Tribunal de Contas da União segundo o qual o seguro-garantia pode, sim, ser exigido em alguns tipos de contratação, não dependendo a prestação da garantia da escolha da modalidade pelo contratado.
Desse modo, diz a Lei 14.133/2021:
Art. 99. Nas contratações de obras e serviços de engenharia de grande vulto, poderá ser exigida a prestação de garantia, na modalidade seguro-garantia, com cláusula de retomada prevista no art. 102 desta Lei, em percentual equivalente a até 30% (trinta por cento) do valor inicial do contrato.
Art. 102. Na contratação de obras e serviços de engenharia, o edital poderá exigir a prestação da garantia na modalidade seguro-garantia e prever a obrigação de a seguradora, em caso de inadimplemento pelo contratado, assumir a execução e concluir o objeto do contrato, hipótese em que:
I – a seguradora deverá firmar o contrato, inclusive os aditivos, como interveniente anuente e poderá:
a) ter livre acesso às instalações em que for executado o contrato principal;
b) acompanhar a execução do contrato principal;
c) ter acesso a auditoria técnica e contábil;
d) requerer esclarecimentos ao responsável técnico pela obra ou pelo fornecimento;
Note que a Administração Pública poderá exigir a prestação da garantia através de seguro-garantia, independentemente do vulto da obra ou serviço de engenharia. A diferença quanto a obras de grande vulto apenas se assenta no percentual da garantia, que chega a elevadíssimos 30% do valor original do contrato, enquanto nas demais obras se atém a 5%, podendo chegar a 10% nos casos de maior complexidade do serviço.
Portanto, em qualquer obra ou serviço de engenharia o seguro-garantia poderá ser exigido e, caso o seja, haverá a previsão de RETOMADA. Isto significa que, no caso de inadimplemento por parte do contratado, a SEGURADORA assumirá a conclusão da obra ou serviço de engenharia.
Agora, pense! É possível imaginar que uma seguradora assuma a execução direta de uma obra ou serviço de engenharia? Evidentemente que não ! Não é de se cogitar que um empresa de seguros possua em sua folha recursos humanos, tecnologia e capacidade de assumir uma obra de qualquer vulto.
Naturalmente que, em casos de inadimplemento pelo contratado, a seguradora assumirá a obrigação e SUBCONTRATARÁ terceiro para execução do restante contratado.
Alguns especialistas já enxergam aqui a formação de um novo mercado, onde seguradoras e construtoras se unem em parcerias para execução de obras via subcontratação.
A possibilidade de a contratação de seguro-garantia ser obrigada traz consigo implicações na formação de pelo menos dois componentes importantes nas obras públicas: formação do BDI e Matriz de Riscos.
A QUESTÃO DO BDI
O BDI (Benefícios e Despesas Indiretas) é um percentual aplicado sobre o custo direto de uma obra ou serviço de engenharia, que tem o objetivo de cobrir os custos indiretos e incluir a margem de lucro da empresa contratada. No contexto do seguro-garantia, é importante considerar as implicações, cuidados e desdobramentos relacionados ao BDI. Vamos analisá-los:
O seguro garantia pode afetar o cálculo do BDI, pois seu custo é considerado uma despesa indireta que pode ser incluída no percentual do BDI. Nesse caso, o valor do seguro garantia será adicionado ao custo da obra ou serviço, influenciando a composição do BDI.
É fundamental que a empresa contratada inclua adequadamente o custo do seguro garantia no cálculo do BDI, garantindo a cobertura adequada e evitando desequilíbrios financeiros no contrato.
O edital da licitação deve estabelecer claramente se o valor do seguro garantia será considerado no cálculo do BDI, evitando ambiguidades e dúvidas na interpretação das propostas dos licitantes.
Desdobramentos:
A inclusão do valor do seguro garantia no BDI pode afetar a competitividade das propostas apresentadas pelos licitantes, uma vez que influencia o custo total da obra ou serviço.
A empresa contratada deve considerar que, durante a execução do contrato, o valor do seguro garantia pode ser atualizado ou renovado, o que pode gerar variações nos custos e no BDI ao longo do tempo.
A administração pública deve estar atenta à adequada previsão e utilização do seguro garantia, fiscalizando sua contratação e verificando se a apólice está em conformidade com as exigências do edital e da legislação aplicável.
A questão da composição do BDI já é complicada mesmo antes dessa novidade quanto ao seguro-garantia. Portanto, deve-se ter em mente que não existe uma unanimidade sobre questões como:
Há divergências sobre quais elementos devem compor o BDI, como custos indiretos, encargos sociais, riscos, entre outros. Alguns defendem que o BDI deve incluir apenas custos indiretos, enquanto outros argumentam que ele deve englobar outros elementos, como a margem de lucro. Essa questão é debatida com base na interpretação da legislação e nas orientações normativas.
Cálculo do BDI: Outro ponto de debate é a forma de cálculo do BDI. Algumas posições sustentam que ele deve ser calculado sobre o custo direto total da obra ou serviço, enquanto outras defendem que ele deve ser calculado apenas sobre determinados itens, como mão de obra e materiais. A metodologia de cálculo adotada pode afetar o valor do BDI e, consequentemente, o preço final das propostas.
Já se vê que a inclusão do seguro-garantia num contexto já tumultuado pelo debate pode trazer mais incertezas que segurança no momento da formação da proposta.
A FORMAÇÃO DA MATRIZ DE RISCO. ANÁLISES, ESCLARECIMENTOS E IMPUGNAÇÕES
A matriz de risco é uma ferramenta utilizada para identificar, analisar e distribuir os riscos envolvidos no contrato de obra. Essa matriz é construída durante o processo licitatório e considera os diversos fatores que podem impactar a execução da obra, como condições climáticas, disponibilidade de recursos, interferências técnicas, entre outros. A matriz de risco permite a avaliação dos riscos potenciais e a definição de estratégias para mitigá-los.
No contexto do contrato administrativo de obra, a interação entre o seguro-garantia e a matriz de risco é de extrema importância. A matriz de risco auxilia na identificação dos eventos que podem desencadear o acionamento do seguro-garantia, uma vez que muitos desses eventos estão relacionados aos riscos mapeados. A partir da matriz de risco, é possível determinar a necessidade de cobertura para situações específicas, como atrasos na entrega da obra, falhas na qualidade, insolvência da contratada, entre outras eventualidades.
A determinação adequada do valor do seguro-garantia leva em consideração a análise dos riscos envolvidos na execução do empreendimento, bem como os potenciais impactos financeiros decorrentes desses riscos. Vamos explorar esse tema em mais detalhes:
Identificação e análise de riscos: O primeiro passo é identificar os riscos relevantes associados à obra, levando em consideração fatores como condições climáticas, interferências técnicas, disponibilidade de recursos, entre outros. Essa identificação permite compreender os eventos que podem ocorrer durante a execução do contrato e que podem levar à necessidade de acionar o seguro-garantia.
Avaliação dos impactos financeiros: Uma vez identificados os riscos, é necessário avaliar os potenciais impactos financeiros decorrentes de sua ocorrência. Por exemplo, atrasos na entrega da obra podem gerar custos adicionais, como multas contratuais ou a necessidade de contratação de serviços extras. Falhas na qualidade da obra podem demandar retrabalhos e correções, implicando custos adicionais para a administração pública.
Definição do valor do seguro-garantia: Com base na análise dos riscos e seus impactos financeiros, é possível determinar o valor do seguro-garantia. Esse valor deve ser suficiente para cobrir os prejuízos decorrentes do descumprimento das obrigações contratuais pela empresa contratada. A legislação estabelece limites percentuais em relação ao valor do contrato para a definição do montante do seguro-garantia, mas é importante considerar se esses limites são adequados para cobrir os riscos específicos da obra em questão.
Revisões ao longo do contrato: É fundamental destacar que a alocação de riscos e seus impactos no cálculo do valor do seguro-garantia podem ser reavaliados ao longo da execução do contrato. Eventos inesperados ou alterações nas condições podem exigir revisões no valor do seguro-garantia para assegurar a adequada cobertura dos riscos remanescentes.
A REGULAMENTAÇÃO
O seguro-garantia atualmente é regulamentado pela Circular SUSEP nº 662/2022. Nesta norma se encontram todos os detalhes daquilo que é preciso saber sobre a contratação do seguro.
Porém, vale destacar alguns pontos:
Art. 5º O Seguro Garantia garantirá as obrigações do objeto principal, para as quais o segurado demandar cobertura.
Perceba que o são cobertas as obrigações “para as quais o segurado demandar cobertura”, ou seja, é fundamental que a alocação de risco seja feita com cuidado no edital de licitação, a fim de que a contratação do seguro-garantia não sofra oneração desnecessária.
Lembrando que o segurado é o ente público; é a ele que se pretende proteger com o seguro. Portanto, é ele quem demandará os pontos do edital que pretende ver cobertos pela garantia.
A esse ponto deve se somar o seguinte:
Art. 6º O valor da garantia deve ser definido pelo segurado em consonância com a obrigação garantida e sua legislação específica.
Esse art. 6º deve ser lido conjuntamente com o anterior. É que as obrigações que o segurado demandar cobertura serão valoradas pelo próprio segurado, daí a necessidade de análise cuidadosa do que define o edital como objeto e como foram alocados os riscos do contrato administrativo.
E A IMPUGNAÇÃO ?
A impugnação do edital, nesse contexto do seguro-garantia, assume importância muito maior do que a que normalmente já possui.
Além de servir de instrumento para promover correções no edital quanto a vários aspectos jurídicos e técnicos, a impugnação ao edital de licitação se transforma no mecanismo de debate sobre alocação dos riscos e devidas quantificações.
Atualmente não é possível que os licitantes, sobretudo aqueles ligados ao setor de construção civil, infraestrutura e cessão de mão de obra, assumam uma postura relaxada quando diante do edital de licitação, acreditando na velha máxima segundo a qual “primeiro eu venço a disputa, depois vejo no que vai dar (!)”.
A impugnação é uma forma de entrar no debate sobre o objeto, os riscos alocados, seus valores e garantias e, quando utilizada tecnicamente, é útil para a própria Administração Pública que, assim, configura a contratação de acordo com um diálogo com os interessados, melhorando a composição de custos e ajustando as expectativas de contratação.
E é isso!
Não se esqueça de profissionalizar suas licitações e contratos com o setor público!
O Registro de Preços é aquele tipo de procedimento auxiliar de licitação que incomoda muita gente: não garante a contratação e, muitas vezes, os quantitativos registrados não representam nem minimamente a realidade das necessidades da Administração Pública para determinado material ou serviço.
Imagine que uma prefeitura publique uma licitação na modalidade pregão eletrônico para aquisição de 1.500 canetas azuis. Evidentemente, os interessados consultarão seus fornecedores e estes apresentarão valores compatíveis com a quantidade estimada de 1.500 canetas. Porém, ao final de um ano, o que se teve na realidade foi a aquisição de 50 canetas apenas. Ora, 50 canetas possuem um preço unitário bem superior ao de 1500 canetas, também considerando o valor de cada uma delas. Sentiram o prejuízo? Quem vende mil e quinhentas vende bem mais barato do que aquele que vende cinquenta, certo?
Agora considerem o prazo de duração de um ano do registro de preços. Pois bem, 1500 canetas foram licitadas. Passam-se 11 meses sem que a prefeitura solicitasse canetas, mas, subitamente, no último mês, solicita o fornecimento de 1.000 canetas para serem entregues no prazo de cinco dias, sob pena de aplicação de penalidade.
Nessa situação, a coisa aperta por dois motivos: 1) provavelmente o fornecedor não terá 1.000 canetas para entrega em cinco dias; talvez tivesse 125, pois registrou seu preço e se preparou para uma entrega mensal que não aconteceu; mas, certamente, 1000 em uma única solicitação ele não vai ter. 2) a caneta não custa mais aquele valor inicialmente registrado. Na verdade, é possível que essa caneta tenha até mesmo dobrado o seu preço e, infelizmente, o fornecedor precisa honrar o compromisso assumido, sob pena de penalidade.
E lá vai dinheiro indo embora
O que pouca gente comenta é que casos como esse acima configuram desvio de finalidade dos órgãos públicos licitantes. Explicaremos um pouco melhor.
Afinal, para que serve e como deve (ou deveria) ser usado o Registro de Preços (RP)?
O SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇOS
A lei que rege as licitações públicas trata superficialmente do RP, deixando a tarefa de definir critérios e detalhes normativos entregues a decretos, que podem ser federais, estaduais e municipais. Logo, a realidade é que temos diversos RP’s em vigor no país; e estes possuem como espinha dorsal, ou marco normativo, o art. 15 da lei 8.666/93:
Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão:
(…)
II – ser processadas através de sistema de registro de preços;
III – submeter-se às condições de aquisição e pagamento semelhantes às do setor privado;
§ 3o O sistema de registro de preços será regulamentado por decreto, atendidas as peculiaridades regionais, observadas as seguintes condições:
I – seleção feita mediante concorrência;
II – estipulação prévia do sistema de controle e atualização dos preços registrados;
III – validade do registro não superior a um ano.
§ 4oA existência de preços registrados não obriga a Administração a firmar as contratações que deles poderão advir, ficando-lhe facultada a utilização de outros meios, respeitada a legislação relativa às licitações, sendo assegurado ao beneficiário do registro preferência em igualdade de condições.
§ 5o O sistema de controle originado no quadro geral de preços, quando possível, deverá ser informatizado.
§ 7o Nas compras deverão ser observadas, ainda:
I – a especificação completa do bem a ser adquirido sem indicação de marca;
II – a definição das unidades e das quantidades a serem adquiridas em função do consumo e utilização prováveis, cuja estimativa será obtida, sempre que possível, mediante adequadas técnicas quantitativas de estimação;
Então é possível dizer que o Sistema de Registro de Preços é um procedimento auxiliar de licitação que tem por objetivo a fixação de um preço junto ao fornecedor a fim de garantir compras futuras e incertas da Administração Pública, desenvolvida mediante licitação nas modalidades concorrência ou pregão, com validade não superior a um ano com estimativa de quantitativo desenvolvida a partir de um consumo provável (média histórica) do órgão licitante.
Veja que a lei repele a prática comum na Administração Pública de considerar estimativos irreais, exageradas e desvinculadas da necessária ação planejadora que antecede toda e qualquer contratação pública.
Por que a Administração Pública faz isso? Por dois motivos: 1) o RP não precisa de dotação orçamentária; 2) porque aumentando irrealisticamente os quantitativos consegue, a uma só vez, reduzir os preços e garantir um excedente imaginário para “cobrir buracos” gerados pela falta de planejamento.
Ou seja: o Sistema de Registro de Preços é comumente usado de modo a contrariar diretamente aquilo que a lei apontou como sua finalidade. E é exatamente daí que vem a questão do DESVIO DE FINALIDADE.
O Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) tem uma excelente decisão a respeito de casos como esses. Vamos examinar rapidamente:
“No entanto, a estimativa de quantidades muito superiores às reais necessidades da Administração, além de potencialmente criar nas licitantes uma falsa expectativa de contratação, pode, eventualmente, frustrar a competitividade do certame e a seleção da proposta mais vantajosa, inibindo a participação de fornecedores capazes de oferecer parcelas menores do bem ou do serviço a serem adquiridos.” (Denuncia 1040578/2022)
Veja que o tribunal reprova a elaboração de quantitativos superiores às reais necessidades da Administração, mas aponta um elemento diferente dos que já mencionamos: a expectativa de contratação aliada à redução da competitividade na medida que inviabiliza a participação de fornecedores de menor porte.
Essa forma de ver também é relevante. Aqui nós avaliamos o que percebemos cotidianamente em nosso trabalho. ou seja, clientes sufocados por registros de preços que se apresentaram minguados, desidratados após o transcurso de meses sem que ordens de compra fossem emitidas pelos órgãos públicos gestores, ou empresas pedindo socorro após recebendo pedidos da integralidade da ata de registro no último mês de sua vigência.
Voltemos à decisão do TCE-MG:
“Por tudo isso, revela-se de extrema importância, na fase de planejamento da contratação, a adequada formalização do termo de referência, documento por meio do qual a Administração deverá indicar de forma precisa, suficiente e clara o objeto a ser contratado, contendo os elementos essenciais capazes de propiciar a avaliação do custo da contratação e a formulação das propostas pelas licitantes.”
Ou seja, PLANEJAMENTO para obtenção de estimativas REAIS.
A falta desse obrigatório planejamento é IMPROVISO, o que se revela um ilícito administrativo. Vejamos o que diz o TCE-MG:
“A finalidade é elemento vinculado do ato administrativo e visa resguardar o interesse público. No caso da licitação, a finalidade imediata é a seleção de fornecedor para contratação pelo licitante,
(…) Esse não é o caso da contratação em exame, sendo essencial observar que a mencionada impossibilidade ou dificuldade de mensuração é a que decorre da natureza do serviço ou da própria necessidade a ser suprida, e não da incapacidade da Administração de promover o adequado planejamento.”
E COMO FICA A SITUAÇÃO COM A NOVA LEI DE LICITAÇÕES?
Em abril/2023 entrará em vigor a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos que altera substancialmente a sistemática atual na medida em que apresenta maior preocupação com a fase de planejamento que antecede à publicação do edital de licitação.
Esse planejamento anterior estará disponível às empresas licitantes, podendo, inclusive, ser alvo de questionamentos e impugnações que podem servir como instrumentos de verificação de realidades contratuais em vários níveis, inclusive quanto a quantitativos ligados a registro de preços.
O tratamento da nova lei se distancia da atual já apontando a natureza obrigacional do registro de preços, conferindo, assim, maior segurança à empresa detentora do preço registrado:
Art. 6º XLVI – ata de registro de preços: documento vinculativo e obrigacional, com característica de compromisso para futura contratação, no qual são registrados o objeto, os preços, os fornecedores, os órgãos participantes e as condições a serem praticadas, conforme as disposições contidas no edital da licitação, no aviso ou instrumento de contratação direta e nas propostas apresentadas;
Agora veja isso:
Art. 40. O planejamento de compras deverá considerar a expectativa de consumo anual e observar o seguinte:
I – condições de aquisição e pagamento semelhantes às do setor privado;
II – processamento por meio de sistema de registro de preços, quando pertinente;
III – determinação de unidades e quantidades a serem adquiridas em função de consumo e utilização prováveis, cuja estimativa será obtida, sempre que possível, mediante adequadas técnicas quantitativas, admitido o fornecimento contínuo;
A mudança é visível e o planejamento a que a Administração Pública ficará, agora, expressamente obrigada (já era anteriormente, mas se esquivava de forma malandra) trará evidentes benefícios ao setor privado que fornece para o governo.
Para reforçar, a nova lei continua:
Art. 82. O edital de licitação para registro de preços observará as regras gerais desta Lei e deverá dispor sobre:
I – as especificidades da licitação e de seu objeto, inclusive a quantidade máxima de cada item que poderá ser adquirida;
II – a quantidade mínima a ser cotada de unidades de bens ou, no caso de serviços, de unidades de medida;
(…)
IV – a possibilidade de o licitante oferecer ou não proposta em quantitativo inferior ao máximo previsto no edital, obrigando-se nos limites dela;
(…)
VI – as condições para alteração de preços registrados;
udo isso parece muito promissor e temos esperança de que seja aplicado com máxima efetividade a fim de, viabilizando o bom funcionamento do setor público com o máximo de economia e eficiência, garanta igualmente direitos e expectativas dos licitantes que se empenharam em oferecer boas propostas comerciais à Administração.
Porém, ainda que a esperança exista, acreditamos que a evolução será lenta. É possível que seja primeiro percebida e no âmbito da União (já é uma realidade) Estados e grandes Municípios, contudo demorará ainda a alcançar as cidades pequenas e médias, onde continuaremos assistindo ao mau uso do SRP, transformando-o em instrumento a desencorajar pequenos empresários a participarem de licitações públicas.
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O General Sun Tzu, que viveu entre 544 e 496 a.c, foi um grande filósofo da estratégia militar chinesa. Dizem que ele desenvolveu uma metodologia de análise das condições de batalha capaz de colocar seus inimigos de joelhos, quando sobreviviam, claro.
Entre os métodos de Sun Tzu, um dos mais conhecidos (e copiados até hoje por militares modernos), centrava-se no conhecimento do terreno de combate. A partir das informações dadas pelo campo de batalha, Tzu definia onde postar sua cavalaria, empregar as espadas de seus guerreiros, posicionar melhor seus samurais e, mais importante, o momento exato de ativar isso tudo, cada um por vez, para alcançar seu objetivo.
“Sim”, você perguntaria, “mas o que tudo isso tem a ver com pregões eletrônicos?”
Bem, se você está se perguntando onde esconder suas espadas ou descansar o cavalo para iniciar a sessão, nada!
Mas pense no terreno.
Agora a coisa começa a fazer sentido. Vamos lá!
O pregão eletrônico é uma modalidade de licitação que se desenvolve, basicamente, num modo de leilão invertido: os preços vão reduzindo à medida que os interessados vão alternando lances até alcançarem o menor valor possível e, com isso, oferecerem ao órgão público comprador o menor preço e, assim, a contratação mais vantajosa para os surrados cofres da administração.
Esse pregão é realizado em uma plataforma virtual. A ideia é fazer com que o maior número possível de interessados participe da competição. Então pode acontecer de, por exemplo, empresas de Porto Alegre – RS participarem de pregão eletrônico para venda de produtos em Quixadá – CE. E a ideia é esta mesmo: ampliar o número de competidores para provocar maior combate pela contratação e, consequentemente, menores preços.
CONHECENDO O TERRENO. MODOS DE DISPUTA. ABERTO E ABERTO E FECHADO.
O pregão eletrônico exige que os lances oferecidos pelas empresas licitantes sejam enviados através de um sistema virtual que garante a segurança das informações.
Não vamos entrar em todos os detalhes desse sistema aqui, mas é importante mencionar que as plataformas de realização de pregões eletrônicos não permitem que os competidores conheçam documentos uns dos outros, ou mesmo que se conheçam uns aos outros. Estas informações somente estarão acessíveis ao final do pregão, para que seja viabilizada a oportunidade de recursos, etc.
Continuando, a competição, no pregão eletrônico, se desenvolve em dois terrenos distintos: o modo aberto e o modo fechado. Vamos conhecer um pouco de cada um.
PREGÃO ELETRÔNICO ABERTO
Esse é o método de leilão invertido comum. Os licitantes se alternam reduzindo preços até o limite do possível, considerando que este possível se refere a particularidades de cada fornecedor individualmente.
No modo de disputa aberto, o edital prevê intervalo mínimo de diferença de valores ou de percentuais entre os lances.
Um pouquinho de legislação: a lei 10.024/2019 diz que a etapa de envio de lances na sessão pública durará dez minutos e, após isso, será prorrogada automaticamente pelo sistema quando houver lance ofertado nos últimos dois minutos do período de duração da sessão pública. Esta prorrogação automática da etapa de envio de lances será de dois minutos e ocorrerá sucessivamente sempre que houver lances enviados neste período de prorrogação.
Resumindo: o último lance demora dois minutos para “vingar”. Se em dois minutos ninguém cobrir o valor que você ofereceu, pode guardar a espada, sacudir a poeira e correr pro abraço; você apresentou a melhor proposta comercial e agora deve começar a se preocupar com a fase de habilitação (que já abordamos diversas vezes em outros posts).
Claro que ainda pode acontecer alguma coisa que lhe tire a vitória das mãos, porém nossa intenção aqui é desenhar o terreno, a estratégia continua sendo sua.
Já dá pra ver que o negócio aqui é redução de preços pura e simples. Luta por milímetros de terreno, ocupação de espaços ocupados pelo “inimigo” através de cansaço, redução obstinada do valor de acordo com o mínimo estipulado pelo edital de licitação, centavo a centavo, uma verdadeira batalha de paciência.
Existem também aqueles licitantes que optam por dar uma ceifada brutal logo de início pra ver se já corta um monte de cabeças, digo, concorrentes de uma só vez. É o caso de os lances começarem em 1.000 e a empresa, de cara, oferecer 500. Isso faz muito samurai de primeira batalha embainhar a espada e voltar pra casa.
Outros preferem ir reduzindo pouco a pouco, testando a paciência dos adversários até que, bang!, dão o golpe decisivo, numa redução abrupta e inesperada que pega os demais de calça, ou melhor, armadura na mão. Tipo, 1000, 990, 980, 970….420, 410. Isso acaba com a moral da tropa, realmente.
PREGÃO ELETRÔNICO ABERTO E FECHADO
O pregão eletrônico no modo aberto e fechado é motivo de irritação de muita gente. É que nesse caso existe, sim, uma sensação de descontrole que requer muito, mas muito cuidado de todos os participantes.
Essa modalidade se inicia como a anterior, um combate desenvolvido a partir das estratégias de cada licitante; um uso calculado de suas melhores armas; avaliação do momento certo e da intensidade adequada de cada golpe; quando, de repente, o céu escurece, a terra treme, os ventos se agitam e pronto! temos o famigerado momento do lance fechado.
Nessa hora não tem mais conversa, é tiro, porrada e bomba, cada um por si, luta de foice dentro do elevador. Sanguinolência pura.
O pregão eletrônico aberto e fechado é assim: os licitantes enviam os lances para o sistema normalmente e a disputa começa. A coisa toda se desenvolve como no modelo aberto, com os competidores baixando preços segundo suas condições e possibilidades. Isso dura quinze minutos e é a parte administrável da batalha.
Depois desses quinze minutos, o sistema informa que haverá o fechamento dos lances. É como uma trombeta ecoando para anunciar o apocalipse licitatório. Daí a dez minutos o céu vai arder.
Então vem o lance fechado. O licitante com menor lance na fase aberta, e todos aqueles com valores até 10% maiores que aquele (normalmente o sistema já indica quem são) podem apresentar um único e último lance.
Pausa para o suspense.
Você se programou durante dias para guerrear pelo contrato (venda), planejou minuciosamente cada redução de preços pensando em sua margem de lucro, negociou com fornecedores, olhou para o estoque, calculou frete, depreciação, impostos, valor agregado, tudo que um excelente espadachim dos negócios deveria fazer. Tudo isso escapou de suas mãos em dez minutos. Você vê a vida lhe passar diante dos olhos, campos verdejantes, sente a brisa da infância quando corria sem compromisso pelas ruas, revisita os sonhos da juventude… Acorda! Tá na hora de vencer mais uma guerra, amigo.
Chegou o momento do lance final. Ele definirá que será o feliz vencedor da contenda, ele mostrará a todos aquele guerreiro melhor preparado, possuidor da espada mais afiada, do martelo mais pesado, da artilharia mais incendiária.
Enfim…
Mostrará quem consegue reduzir ao máximo o preço. Isso de uma única vez, sem enrolação, sem disputa estratégica, sem choro nem vela.
Já participamos de pregões em que nenhuma empresa ofereceu lance na fase aberta. Ficaram todos esperando o sistema anunciar o fechamento para dar o golpe final e experimentar a sorte. Isto acontece muitas vezes.
Porém, existem licitantes que já reduzem o preço na fase aberta para “sentirem o terreno” e testarem a “dureza” das armaduras adversárias para, no momento em que o sistema anuncia o lance fechado, reduzirem menos do que poderiam. Pode dar certo.
Essa última estratégia costuma colher melhores resultados na medida em que tem maiores condições de eliminar os kamikases e aventureiros aos poucos, dentro dos primeiros 10 minutos de competição.
Mas não há garantias.
A verdade é que sempre orientamos nosso parceiros a respeitarem seus próprios limites e evitarem Maldição do Vencedor.
O Pregão Eletrônico é uma modalidade de disputa que pode ferir susceptibilidades. É comum que licitantes mais entusiasmados avancem sem proteção na retaguarda para a frente de combate, comprometendo suas possibilidades de garantir um contrato sustentável.
É, por fim, um combate. E, como em todo combate, é melhor não perder a cabeça.
Quer participar de licitações de forma segura e competitiva? Fale com a gente clicando
Quem de vocês que participa de licitações e já viu edital exigindo, para a comprovação da capacidade técnica, a necessidade de demonstração da execução de quantitativos mínimos em obras e serviços de características semelhantes?
Pior: esta exigência costuma vir acompanhada do seguinte: limitada às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto licitado.
Instaura-se a confusão, obviamente. Afinal, quanto poderá ser considerado um quantitativo mínimo? e qual é a parcela de maior relevância da obra ou serviço ? O valor significativo é o aspecto mais importante a ser observado?
É preciso respirar fundo e enfrentar o edital de licitação com coragem e senso crítico nessas horas.
Conhecer a legislação também é fundamental.
Ah, e acompanhar o entendimento dos tribunais de contas também é muito importante.
Mas vamos lá.
O QUE DIZ A LEI
O art. 30 da lei 8.666/93 diz o seguinte:
Art. 30. A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a:
II – comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos;
§ 1o A comprovação de aptidão referida no inciso II do “caput” deste artigo, no caso das licitações pertinentes a obras e serviços, será feita por atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente registrados nas entidades profissionais competentes, limitadas as exigências a:
I – capacitação técnico-profissional: comprovação do licitante de possuir em seu quadro permanente, na data prevista para entrega da proposta, profissional de nível superior ou outro devidamente reconhecido pela entidade competente, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, limitadas estas exclusivamente às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto da licitação, vedadas as exigências de quantidades mínimas ou prazos máximos;
§ 2o As parcelas de maior relevância técnica e de valor significativo, mencionadas no parágrafo anterior, serão definidas no instrumento convocatório.
§ 3o Será sempre admitida a comprovação de aptidão através de certidões ou atestados de obras ou serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior.
O primeiro ponto que chama atenção diz respeito à ligação entre as exigências de quantitativos e parcelas significativas à capacidade técnica profissional, que já tratamos aqui. Basicamente está ligada ao profissional responsável técnico pela execução do contrato, não à empresa prestadora do serviço.
Porém, conforme tratamosaqui, o Tribunal de Contas da União estende a demonstração desse tipo de capacidade técnica às pessoas jurídicas, conforme exposto na Súmula/TCU 263:
“Para a comprovação da capacidade técnico-operacional das licitantes, e desde que limitada, simultaneamente, às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto a ser contratado, é legal a exigência de comprovação da execução de quantitativos mínimos em obras ou serviços com características semelhantes, devendo essa exigência guardar proporção com a dimensão e a complexidade do objeto a ser executado.“
A nova lei de licitações ( 14.133/2021) deixa as coisas mais claras:
Art. 67. A documentação relativa à qualificação técnico-profissional e técnico-operacional será restrita a:
I – apresentação de profissional, devidamente registrado no conselho profissional competente, quando for o caso, detentor de atestado de responsabilidade técnica por execução de obra ou serviço de características semelhantes, para fins de contratação;
II – certidões ou atestados, regularmente emitidos pelo conselho profissional competente, quando for o caso, que demonstrem capacidade operacional na execução de serviços similares de complexidade tecnológica e operacional equivalente ou superior, bem como documentos comprobatórios emitidos na forma do § 3º do art. 88 desta Lei;
III – indicação do pessoal técnico, das instalações e do aparelhamento adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada membro da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos;
IV – prova do atendimento de requisitos previstos em lei especial, quando for o caso;
V – registro ou inscrição na entidade profissional competente, quando for o caso;
VI – declaração de que o licitante tomou conhecimento de todas as informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação.
§ 1º A exigência de atestados será restrita às parcelas de maior relevância ou valor significativo do objeto da licitação, assim consideradas as que tenham valor individual igual ou superior a 4% (quatro por cento) do valor total estimado da contratação.
§ 2º Observado o disposto no caput e no § 1º deste artigo, será admitida a exigência de atestados com quantidades mínimas de até 50% (cinquenta por cento) das parcelas de que trata o referido parágrafo, vedadas limitações de tempo e de locais específicos relativas aos atestados.
Viram? A nova lei deixa muito menos (ou quase nenhum) espaço para o gestor público decidir por ele mesmo o que é parcela relevante, valor significativo ou quantitativo mínimo.
A lei 8.666/93, devido a sua abstração e generalidade, levou os órgãos públicos licitantes a trabalharem com bastante liberdade, o que por sua vez levou os tribunais de contas a agirem com rigor na limitação dos excessos, o que gerou insegurança dada a imprecisão dos termos.
Mas, para deixar claro, ainda que a licitação do seu interesse seja regida pela Lei 8.666/93, é recomendável que observe com cuidado as definições de parcela relevante, valor e quantitativos mínimos, sempre com o objetivo de impedir abusos que levam a exclusão de licitantes e diminuição da competitividade da licitação.
É válido considerar como “parcela de maior relevância técnica” o conjunto de características e elementos que individualizam e diferenciam o objeto, evidenciando seus pontos mais críticos, de maior complexidade técnica e risco mais elevado para a sua execução. É aquilo que é realmente caracterizador da obra ou do serviço, que é de suma importância para o resultado almejado pela contratação.
MAS E QUANDO O EDITAL NÃO FALA NADA ? IMPUGNAÇÃO
Bem, é obrigatória que o órgão licitante, quando optar por estabelecer qualquer tipo de limite autorizado por lei em sua licitação, defina claramente o que entende ser uma qualificação técnica adequada para a execução do contrato.
Mais: é obrigatório que apresente justificativa evidenciando os motivos por que implementou exigências restritivas no seu edital de licitação.
Quando a Administração Pública não faz constar no edital o que exatamente considerará como parcela de maior relevância, a saída que a empresa interessada tem a sua disposição é a impugnação do edital.
A impugnação do edital de licitação é o instrumento capaz de atrair a atenção do órgão público para a lacuna presente no edital, e deixar claro que esta lacuna implicará em redução do número de interessados e, com isso, através da diminuição das opções de escolha, provocar o desatendimento do interesse público subjacente a todas as contratações públicas.
O mesmo deve ser feito quando a escolha da parcela mais relevante for inadequada. Pode acontecer de o gestor público apontar determinada parte da obra ou serviço como a mais complexa, a partir da consideração apenas dos valores envolvidos. Contudo, essa parcela mais onerosa pode não representar a parcela da execução que envolva maior dificuldade e experiência para sua execução, como, por exemplo, um ponto onde a tecnologia tenha relevância fundamental para a conclusão da atividade; podendo ser menos impactante financeiramente, mas de alta repercussão no conjunto do contrato.
Também nesse caso a impugnação é o mecanismo pelo qual o licitante corrige o edital e o torna mais adequado à realidade do mercado, sobretudo quanto este é especializado, pois muitas vezes o gestor público não conhece integralmente a dimensão e nuances daquilo que pretende contratar.
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